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terça-feira, 22 de abril de 2008

Missão Cumprida

Não. Não corri uma maratona, nem uma meia nem sequer cheguei à meta de uma prova curta. Nem fiz um treino longo nem sequer um curto. Nem suei que nem uma égua a exercitar-me entre quatro paredes nem nadei que nem um golfinho durante horas seguidas, ou minutos que fossem. Nada disso.

Ainda assim, chego à noite e tenho a inequívoca sensação de missão cumprida. Aquela que os bloguistas (onde eu me incluo evidentemente) enaltecem e valorizam sobremaneira cada vez que saem para a rua e fazem um treino de 30 minutos ou de 2h30m, ou mesmo sem sair de casa fazem 300 abdominais e 20 séries de levantamentos de pesos, e depois ainda suados, correm para o computador e escrevem: “Missão cumprida”. Hoje, sem ter feito nada disso, escrevo também sem qualquer dúvida: “mais um dia de Missão Cumprida!”

Hoje, eu só coloquei o despertador um nadinha mais cedo que o habitual pois tinha deixado a máquina da roupa a trabalhar e queria deixá-la estendida antes de sair para o trabalho. Assim fiz, tomei duche, vesti-me, despertei a filhota com muitos beijinhos, preparei o lanche dela e o meu acrescido de almoço. De seguida o pequeno almoço, pão de sementes torrado com manteiga e queijo para ela, e leite com chocolate. Para mim café com leite e pão seco, que o queijo e a manteiga é preciso fazer render, e o meu corpo já tem reservas a mais.

Pequeno-almoço juntas. Momento feliz do dia. Que dá início à rotina diária que se deverá repetir. As mochilas para as diversas actividades do dia já preparadas de véspera são colocadas às costas e deixadas no ATL, e a miúda ao portão da escola, onde faço questão de a deixar todas as manhãs.

Apanho o autocarro e de seguida o barco. Numa caminhada de 10 minutos estou no escritório. Trabalho. Cumpro. Pelo meio assuntos pessoais. Vários. Muitos. Indignações, reclamações, pedidos, preocupações, e assim se avança mais um pouco nesta vida. Obstáculos transpostos ou apenas diminuidos e/ou adiados mais uns dias. Vencidos uns, ainda por vencer outros, e outros novos que surgem agora.

Fim de expediente. Regresso a casa. Compro queijo e manteiga da marca que está em promoção e com o valor do desconto oferecido, é-me possível trazer uma dúzia de ovos sem pagar. Boa!

Vou buscar a miúda à escola. Converso. Deito água nos canteiros que insisto um dia darão flor. Recolho a roupa. Recolho comida espalhada pela casa, e faço puré de batata e hambúrger para ela. Uma taça de nêsperas descascadas e sem caroço são a sobremesa. Mais uma noite com jantar na mesa. Para ela. Eu não me lembro do que jantei ou se jantei sequer, mas isso não tem importância nenhuma.

Ao serão, buscamos juntas um poema que ela terá de recitar na aula de Oficina da Palavra amanhã. Para estas e muitas outras coisas é útil a Internet. Analisamos vários.

- Humm… bonito mas muito grande, e tem assim palavras… - diz ela a torcer o nariz.

- Pois, não percebes nada disto, não é? Já agora devia ser um poema que entendesses, né?

Depois de passarmos por Fernando Pessoa (muito pesado para a criança), Cecília Meireles, Sofia de Mello Breyner, entre outros (e até Bocage! – claramente inadequado à ideia e à idade, mas foi giro ler em conjunto alguns) - recaímos sobre Vinicius de Moraes, e a escolha foi para:

"O Elefantinho

Onde vais, elefantinho
Correndo pelo caminho
Assim tão desconsolado?
Andas perdido, bichinho
Espetaste o pé no espinho
Que sentes, pobre coitado?

– Estou com um medo danado
Encontrei um passarinho!"

Vinicius de Moraes


Depois de estudadas as várias e possíveis entoações e dicções, a decisão estava tomada. Será recitado amanhã “O Elefantinho”.

Dentes lavados, beijos doces e a menina vai para a cama. Dormir e descansar, que estas crianças de agora não têm a vida muito mais descansada que a de um adulto e não muito menos responsabilizada que a destes.

Cozinha arrumada e sento-me aqui porque escrever é preciso. E agora, ainda antes da meia noite, embora cansada e apesar de ter tido um dia vulgaríssimo de uma vulgaríssima mulher, com actividades vulgaríssimas, hoje sinto que cumpri a missão. A missão de hoje foi plenamente cumprida. E não precisei de correr para o sentir …


No entanto, no entanto, missões à parte, ando com a pulga atrás da orelha: “E não vais ao Guincho?” “Sempre vais ao Guincho?” “E não queres ir ao Guincho?” “E porque não vais ao Guincho?” - Ai… insistam só mais um bocadinho e ainda acabo lá! Nem que seja a caminhar… Ou talvez não. Até lá há ainda muitos dias para cumprir.

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