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sábado, 29 de dezembro de 2018

Estórias que as casas nos contam

À força de tantas vezes passar por ela, ela, a casa, acabou por confiar na rapariga e contar. Aos anos que suporta o fardo do segredo, do que aconteceu e se quis apagar e esquecer. Mas há coisas que é impossível apagar ou esquecer.

O António e a Rosa viviam na casa há pouco mais de três anos. Um amor genuíno, puro e rebelde que acabou por convencer os pais e lá os jovens juntaram os trapinhos e viviam maritalmente felizes como poucos. A vida no campo era dura e fosse pelo árduo trabalho ou por imperfeição do corpo da Rosa (sim, já que no varão não se supunha sequer que residisse a causa) a Rosa não emprenhava. E se tal questão não fazia vacilar o seu amor, a verdade é que um certo mau estar se vinha a instalar entre o casal, pressionado pelos familiares e vizinhança e pelo seu próprio ego.

E foi na altura da apanha do milho que tudo aconteceu. Vinham pessoas de fora que ficavam albergadas no palheiro, num piso acima, mesmo por cima dos animais. Eram moços e moças novas, que traziam alegria, reboliço e novidade ao lugar.

A Rosa, de olhos claros e pele escura curtida pelo sol, de sorriso fácil, branco e franco, irradiava alegria e simpatia. Depressa falava com todos, tratava-os pelo nome e adorava conversar e saber coisas de outros lugares e outros costumes. Já o António, rapaz reservado, tímido e pouco falador, limitava-se ao contacto estritamente necessário ao trabalho e não via com bons olhos a simpatia e a admiração que a sua Rosa recebia de todos os forasteiros.

Já se habituara à atenção que a Rosa sempre despertara. Mas desta vez era diferente. Ele sentiu-o pela primeira vez quando, à roda da fogueira, cá fora, à noite, findo o dia de trabalho, a Rosa dançava numa roda, como as outras moças, de mão em mão, e rodopiando as saias e dando uma volta sobre si própria, acaba de encontro ao peito daquele estranho, alto e bonito. Com um sinal na face direita em forma de um minúsculo coração, de olhos de um castanho claro cor de mel, cabelo louro e camisa branca amarrotada, destacava-se de todos os outros. Ampara a Rosa num gesto natural mas num abraço exageradamente demorado aos olhos do António. Por um instante, parecia que o tempo parara e o casal ficara abraçado de olhos nos olhos e sorriso nos lábios por uma eternidade.

Os dias passavam e o António distanciava-se mais e mais, muito mais rapidamente nestes dias do que nos últimos meses de vida em comum do casal. Mal humorado, sem palavras mas roído de ciúme. A Rosa, alegre por natureza, ignora os sinais e foi sempre igual a si própria e quando deu por si, estava no milheiral, embrulhada com o forasteiro alto e bonito e peito que parecia desenhado à medida para ela se aninhar. Os corpos despidos, o toque da pele, os beijos trocados, as carícias prometidas nos olhares trocados nos dias anteriores, foram completamente cumpridas em cada milímetro de pele dos seus corpos. 

O trabalho no campo avançava e a Rosa sabia que o forasteiro partiria em breve. Alheia ao mau humor do António e à sua crescente e aparente indiferença, ou até incentivada por ela, a Rosa voltou a procurar o forasteiro e amou-o com o corpo e a alma até ao êxtase, por entre os fardos de palha e os balidos dos animais. 

O dia da partida chegou e com ela se abateu uma tristeza sobre a Rosa, no entanto feliz pelo que vivera. O António, de novo sozinho com a Rosa, parecia agora mais feliz, mais descansado e bem disposto, agora aparentemente indiferente à tristeza da Rosa.

Os dias do casal voltaram ao normal, e o António chegou mesmo a voltar a procurar a Rosa, que de olhos fechados e punhos cerrados, se deixou possuir, enquanto sonhava com outro rosto, outra boca, outras mãos, e uma lágrima se soltava.

Várias semanas se passaram e o ventre da Rosa começou a crescer. O António, radiante, parecia feliz como nunca, de uma alegria tão contagiante que a própria Rosa chegou a voltar a parecer feliz.

Depois...depois chegou o dia do parto. A curiosa mandada chamar da vizinhança mais próxima mandou sair o António enquanto a Rosa gritava de pernas abertas. 

Nervoso o António, aguardava cá fora, a antecipar a melhor alegria da sua vida: um filho, finalmente. Varão, claro, nem outra coisa seria de esperar. Por fim os gritos da Rosa acalmaram e ouve-se o choro de uma criança. É um rapaz! É um rapaz! Grita a curiosa.

O António entra disparado na divisão e aproxima-se da Rosa, a certificar-se que estava bem, ao mesmo tempo que deita um olho ao recém-nascido embrulhado num lençol branco. Tudo sereno. A Rosa sorri, o petiz geme como um gatinho e o António sorri também e enterra o rosto no peito de Rosa, e quando o levanta a Rosa jura que lhe viu uma lágrima a escapar-se. De alegria. 

A vizinha já saíra e o casal está agora só com o petiz. Os três e a casa por testemunha.
A Rosa, estende o bebé embrulhado ao António. Pega-lhe, diz-lhe. E o António pegou, aconchegando-o no colo. Afasta um pouco o lençol para lhe vislumbrar o rosto e nesse instante...Não! Grita, ao descobrir na face direita um minúsculo sinal em forma de coração na minúscula face direita do bebé...Nãaaoooo!

A Rosa grita desesperada enquanto o António eleva o recém nascido no ar, já desembrulhado e a chorar desalmadamente, despido, avermelhado e cabeçudo, com a cabeça a tombar para trás, numa posição estranha e perigosa, e o exibe mesmo em frente da cara da mãe, olha, olha o que fizeste, sua cabra! Nãoooo, grita a Rosa, e de navalha em punho o António desventra o cachopo, numa chacina nunca vista. Gritos ensurdecedores da Rosa misturados com o choro do menino que se calaram já, e agora só a Rosa, a Rosa e os gritos de quem não suporta a dor na alma e já endoideceu e pede para morrer também. Os gritos da Rosa, o sangue e o palavreado enlouquecido do António enchem a casa e entranham-se nas suas paredes, atravessando-as até às mais profundas estruturas e marcando-a para sempre, como machado espetado fundo num tronco.

No dia seguinte, quando as vizinhas vieram para visitar a mãe e o petiz, encontraram uma mulher de boca exageradamente aberta num grito agora mudo e olhos vidrados fixos no tecto da casa, gritando em silêncio o horror vivido, e um recém nascido sobre ela, ambos desventrados numa poça de sangue, e um homem pendurado numa corda na árvore defronte da casa, a balançar levemente, ouvindo-se apenas o subtil ranger da corda no tronco da árvore, para cá e para lá, para cá e para lá, conforme o corpo oscilava num balançar trágico e triste.

E ainda hoje, em dias em que por um motivo qualquer mais nada se ouve, há quem ali páre, à sombra da árvore, para descansar ou beber água do cantil, e garanta que ainda ouve o ranger da corda, a balançar presa no tronco, a suportar o peso de um corpo que balança levemente, para cá e para lá, para cá e para lá.








quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Banco de Jardim


Passo por ele, hoje só, triste e vazio. A combinar com o tempo cinzento deste Inverno e desta manhã. A aguardar pelos Domingos de Sol que trazem as famílias felizes com os seus petizes irrequietos que apenas se aproximam dele (do Banco de Jardim) para darem uma dentada no lanche que a avó trouxe, entre um chuto na bola e uma corrida pela relva para apanhar de novo os amigos. Aguarda pacientemente por outros dias, de Sol, para ser ocupado pelos idosos conversadores, pelos desempregados a arrastar os pés a chorar a triste sina, enquanto fazem uma pausa no Banco de Jardim. Entre a miséria da vida e o regresso a casa, é o Banco de Jardim que os apoia, segura, escuta e abraça.
Aguarda também por outros dias em que o Jardim se enche de jovens adolescentes, que escapam entre intervalos das aulas a viverem os primeiros amores. Os primeiros beijos trocados no Banco de Jardim. E outros amores maduros também. Silenciosamente, o Banco de Jardim guarda segredos como ninguém.

Hoje o dia está triste e o Banco de Jardim também. Ainda assim, ampara as folhas caídas das árvores. Vê-me passar por ele, o Banco de Jardim, a caminhar. Não paro. Caminho a ritmo regular, a sentir cada passo seguro e bem estudado antecipadamente, com precaução, como se cada passada, desde o levantar do pé até pousar no chão um pouco mais adiante fosse uma manobra perigosa e carecesse de projecto avançado de física e engenharia. De dentes e punhos cerrados nalguns deles, a suportar as dores ou apenas a temê-las. Dores normais, diz o médico. Se é normal, avancemos. E se caminhar é preciso, caminhemos.

E o Banco de Jardim é hoje a minha companhia. E eu passo, olho-o e sigo em silêncio. Nem os pássaros se ouvem cantar hoje…e os segredos que eu hoje conto ao Banco de Jardim são um sussurro demasiado vago e imperceptível. No entanto, sei que ele amanhã se vai recordar deste dia e estes segredos, ficarão com ele bem guardados, como todos os outros que já lhe confiei, de quando me levantava às cinco da manhã e ia Correr, e ele, era um ponto de encontro, um local seguro, onde muitas vezes fazia exercícios de alongamento depois dos treinos madrugadores. Ele diz-me que adorava esses momentos e que tem saudades. Confesso-lhe baixinho que eu também…







quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Regresso aos treinos escritos e descritos





Fim de dia. É noite já. Algumas janelas dos prédios próximos exibem já uma árvore de Natal iluminada e enfeitada. Que exagero, pensa a rapariga...Que pressa que a Vida passe rápido! E ela passa já tão demasiado rápido...E ela quer ainda viver tanta coisa, rir tanto, amar tanto, beijar tanto, viajar tanto, surpreender tanto, ser surpreendida pela positiva também, correr tanto...

Sai do escritório já equipada e ruma ao Parque. Pensa que liga o relógio, mas não liga, que os olhos já lhe falham e a nabice com as tecnologias são uma característica incorrigível nela. Correu com as árvores. Despidas. Sem luzes ou artifícios de Natal ou outros. Só elas, nuas e belas, apenas iluminadas pelo frontal da rapariga! Um pequeno paraíso no meio do bulício das vilas próximas, a aspirar a metrópole, como se isso fosse uma coisa boa.! Mas aqui, apenas as árvores e ela! E alguns espectros, claro! Belíssimo! Ah sim, também encontrou dois amigos, mas eles correm noutro campeonato e o encontro durou escassos segundos! O resto foi mesmo só com as árvores! E foi muito bom! Fim de dia em cheio! Porque Correr faz milagres!


sexta-feira, 9 de novembro de 2018

15ª Maratona do Porto - 4 de Novembro de 2018



MARATONA DO PORTO

Conheci-a um embrião. Sem rosto e sem corpo, ainda um ser imaginário, que desde cedo muitos desejaram e a quem já davam as boas-vindas e outros tantos denegriram, mesmo antes dela ver a luz do dia. Mas ela vingou, nasceu mesmo e viu a luz do dia em Outubro de 2004 com 317 atletas chegados à meta. 
Eu não estive presente e perdi o seu nascimento. Mas no seu primeiro aniversário, pelo 2ª edição da prova, eu fui lá corrê-la e desde essa data nunca mais faltei. Poucas vezes a correr a Maratona, é verdade, mas sempre presente, a correr a Family Race, ou até a fazer a Caminhada ou ainda, por lesão extrema, simplesmente a apoiar quem corre. Sempre presente! E é com muito gosto e orgulho que fui assistindo ao seu crescimento e evolução. Talvez por a acompanhar desde os seus primeiros passos tenho por ela um carinho muito especial e é sem dúvida a Maratona do meu coração. Não que feche os olhos a alguma coisa menos boa, que sempre as vai havendo, mas atenta e crítica e é com orgulho e prazer ver a Organização ano após ano, querer melhorar, servir melhor, com uma frontalidade e responsabilidade rara, num compromisso assumido de bem servir os corredores. 

E chegamos a 2018. É a 15ª edição da Maratona do Porto, prova consolidada, com muitas provas já dadas pelo caminho até aqui, com tropeços e avanços, mas hoje é inegável que ocupa meritoriamente um lugar notável conquistado no panorama da Corrida, quer nacional quer Internacional. 

Extremos: de besta a bestial e de bestial a besta num ápice

Sabemos que as gentes não perdoam. O povo, o público, a sociedade. E que hoje dormes no chão de um quarto partilhado com 4 pessoas, e a tua única companhia é um cão grande que encostado a ti, te ajuda a aquecer o corpo estendido no chão porque te faltam cobertores e amanhã estás num luxuoso quarto de um qualquer hotel de 5 estrelas. Do nada ao tudo num instante. Do tudo ao nada noutro instante ainda mais veloz. É a celeridade e a efemeridade da vida, onde o imediato é que conta para a maioria, esquecendo depressa e facilmente o que não se devia esquecer: o que se construiu, a obra feita, as provas dadas, as dificuldades, as circunstâncias, o factor humano, sempre presente! Seguimos o rebanho ou paramos para pensar?


Lisboa, Sábado, 3 de Novembro de 2018, 8 horas da manhã

Enche-se um autocarro com destino à Maratona do Porto. 67 pessoas ao todo, incluindo participantes nas várias provas do evento. Transporte disponibilizado pela Organização, a Runporto, tal como tem feito nos  anos anteriores. Organizo e coordeno a viagem. Bem ou mal, desde o início praticamente. E cada ano me desafio de novo. A fazer de novo. Igual ou melhor. Como posso, como sei. É sempre um desafio que muito me enriquece e gratifica. 

Vamos directos à Feira da Maratona no edifício da alfândega no Porto. Aí se levantam os dorsais e kit do atleta com t-shirt e brindes de patrocinadores, e se almoça também. Pasta Party: massa com fartura, carne, queijo, fruta, gelatina, bebidas e pão. E quando, porque eu não como carne, já me preparava para ficar apenas com uma pratada de massa, surpreendentemente oferecem-me uma bolonhesa de soja! Fantástico penso! É um pormenor, claro, mas também as grandes coisas são feitas de pormenores.
Encontro com vários amigos. Sempre um prazer rever, e visita à feira, que está cada vez melhor. Muito bem composta. Um espaço agradável com vários stands de interesse para os corredores. Podia perder-me por ali, mas ala que se faz tarde. Voltar a meter toda a gente no autocarro e rumar à Rotunda da Boavista. Daqui seguimos para o hotel e por fim descanso um pouco. Sinto que a 1ª etapa da jornada está feita! Cálice de Porto na mão, degustado lentamente e estou no céu por momentos, apesar de estar apenas num 4º andar.


Recosto-me e sonho acordada que é habilidade que muito prezo em alimentar e daqui a nada são 6 da manhã de domingo e estamos já à mesa do farto pequeno almoço.
Iguarias do melhor e só penso que pena ir correr e não poder comer tudo à vontade (ainda me lembro do excesso de ovos mexidos do ano passado, que correram comigo a prova toda, 15 km também, entre o estômago e a garganta!) 

O hotel tem autocarros que nos levem à partida e lá vamos nós. Mais ou menos nervosos. Eu não ia fazer nada de especial, apenas 15 Km, e de nervosa pouco tinha, o que me chateia! Bom, bom é sentir a adrenalina ao rubro nestes momentos antes dela, da prova rainha, da Maratona! Mas eu ia só fazer 15 km...um pequeno desafio, ainda assim sem a confiança de o conseguir superar. Só queria fazer os 15 km a passo de Corrida. Só queria não me ver obrigada a caminhar, a gatinhar ou a rastejar, o que poderia muito bem acontecer, tendo em conta a minha forma.

Na zona da partida deram-nos uma espécie de manta térmica, um plástico que até soube muito bem pois era cedo e estava fresco. Mas esse foi um dos erros da organização, como se verificou mais tarde, quando faltaram plásticos para os atletas que acabavam a Maratona, depois de várias horas debaixo de chuva forte e vento frio!

Reencontra-se sempre amigos nesta zona da partida, enquanto fazemos tempo e há um prazer genuíno nestes reencontros. Até podemos encontrar-nos apenas uma vez por ano, mas há uma alegria genuína nos sorrisos e nos abraços! E que estejamos lá todos para o ano novamente, é o que se deseja!

Vou para a minha zona de partida e é dado o tiro. Sei que os da Maratona vão ali à frente. Partem à nossa frente. Ouço a música e não deixo de me emocionar. Sempre! Feliz por eles, feliz por mim, por me ser permitido ali estar, mesmo só na Family Race. E para o ano...não sei. Aprendi a resguardar-me das promessas pois a vida coloca-nos muitas e variadas rasteiras, mas que gostaria de estar ali à frente, a partir para a Maratona, ai isso gostava, oh se gostava!

Mas agora não é tempo de pensar nessas coisas. Agora é tempo de concentrar-me no meu passinho o mais certo possível, acreditar que o posso manter por 15 km, assim como a respiração controlada e estável, e seguir, um pé a seguir ao outro. Alguns Maratonistas por perto. Alguns equipamentos curiosos, muitos estrangeiros e é uma alegria correr aqui. Muita gente a assistir, a animar a malta. E animamos! Rotunda do Castelo do Queijo, subir parte da Boavista, contornar o Parque da cidade, ir a Matosinhos, porto de Leixões e regresso, de novo subir e descer um pouco da Boavista e por fim ir cortar a meta, feliz e contente, no Queimódromo. Os abastecimentos estiveram bem, a animação era muita. Chip incorporado no dorsal, postos de controlo, percurso totalmente fechado ao trânsito e chegada pomposa à meta, com direito a foto, medalha e muitos mimos. Dispenso a cerveja e procuro o meu pai para seguirmos para o hotel. O tempo, já com alguma chuva durante a prova agravava-se agora. Seguimos para o hotel. Banho retemperador e segue-se almoço com amigos. Muito, muito bom! Mas...vir à Maratona do Porto e não correr a Maratona, pode ser muito bom correr a Family Race, mas... não é a mesma coisa.

Soube mais tarde pelos amigos que chegavam da Maratona, que algo tinha corrido muito mal: o guarda roupa. Que a organização disponibilizou mas que funcionou pessimamente mal, agravado pelas também péssimas condições atmosféricas. Se estivesse bom tempo, as pessoas iriam beber a sua cerveja, alongar, confraternizar no espaço que têm para isso, e não, como aconteceu e é perfeitamente compreensível, irem todos ao mesmo tempo, mal cortavam a meta, a correr buscar o seu saco na ânsia de vestirem roupa seca e saírem dali. A arrumação dos sacos também não era a melhor e além disso muitos sacos ficaram à chuva, molhando as roupas que continham. Assim, muitos atletas esperaram perto de 1 hora para recuperarem o seu saco e quando o conseguiram, tinham as suas roupas completamente encharcadas. Além disso, faltaram os ditos plásticos para se protegerem do frio. Os tais, que foram dados na partida, perfeitamente dispensáveis aí.Um cenário muito triste, com a organização desesperada por não conseguir responder e os atletas desesperados sem condições para se abrigarem e trocarem. Muito, muito mau. Perigoso até. Correr uma Maratona com chuva e vento frio e ao terminar ficar completamente desabrigado, é mau demais. Na minha opinião, os sacos de plástico, fornecidos pela organização para os atletas porem as suas coisas, como acontecia nos anos anteriores, onde o nr. de dorsal fica bem visível e os sacos uniformizados facilitava a arrumação dos mesmos e agilizava a sua entrega. Mas este ano não deram esses sacos de plástico. Cada atleta identificava o seu próprio saco com uma pequena tira onde estava mencionado o nr. de dorsal. O agravamento do tempo a juntar-se a tudo isto, levou ao caos que se viveu por ali.

Vem o director da prova, Jorge Teixeira, no dia seguinte assumir publicamente o erro grave que se cometeu, pedir desculpa e prometer que jamais se repetirá uma situação destas.

E agora? Valem de pouco as desculpas dirão alguns. Pois eu digo que o que não vale de nada é ficarmos agarrados ao que correu mal, dizermos cobras e lagartos e deixarmos de ir à Maratona do Porto. Vale a pena sim, acreditar num Homem que em 14 anos pôs de pé uma Maratona de qualidade como Portugal nunca teve, ao nível das melhores que se fazem lá por fora! Porque quem admite, assume com frontalidade e vai corrigir, só pode continuar a merecer toda a minha admiração, respeito, confiança e preferência! Porque errar é humano. Porque só não erra quem nada faz! 

Por isso, por tudo o que a Maratona do Porto já provou, e por tudo o que conseguiu dar à Corrida em Portugal e no Mundo, pela frontalidade, coragem e seriedade do homem que está à frente dela, para o ano eu só posso dizer "presente" na 16ª edição, já com data marcada: 3 de Novembro de 2019.

E continua a Runporto a merecer toda a minha confiança. Parabéns pela realização da 15ª Maratona do Porto, que mesmo com o desfecho que se viu, esteve perfeitamente bem em tudo o resto! Se foi grave? Foi! Se acredito que não se vai repetir? Acredito! Pois se os atletas sofreram na pele, adivinho sem falhar muito que a Organização sofreu na pele e na alma, a falha que aconteceu e que não podia ter acontecido.

E tu, vais lá para o ano?


Ana Pereira



























15 Km da Family Race corridos em 1h36m16s. Classificada na posição 2055 de um total de 2769 chegados à meta da Family Race.

Total de atletas chegados à meta na Maratona: 4658 atletas

Resultados podem ser vistos aqui 

Fotos:

Pela Prozis, para ver aqui, Album 2  

e Album 1, para ver aqui

e Km 35, para ver aqui, também da Prozis

Por Matias Novo, para ver aqui

Pela Organização, para ver aqui

e Album 2, para ver aqui

Pela inAction, para ver aqui

Por Project Run, Album 1, para ver aqui     e Album 2, para ver aqui

Por Objetiva em Movimento:

Album 1, para ver aqui

Album 2, para ver aqui

Album 3, para ver aqui

Album 4, para ver aqui

Album 5, para ver aqui

Por mim, album quase pessoal, para ver aqui

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

38ª Corrida do Tejo


Domingo, 23 de Setembro de 2018


Mas não queres falar nisso? Estás-me a evitar?! Tu não estiveste nessa coisa do Tejo? Na Corrida? Conta lá como foi! Eu conto, eu conto, ando só cansada, muito cansada, só isso, tal qual como corri neste dia.Mas eu conto.

O convite estava feito e eu não ia falhar. Podes pensar que sabes tudo da prova se visitares o site da Organização, mas não. Enganas-te redondamente! Não ficas a saber quase nada para além de que a prova é organizada pela Câmara Municipal de Oeiras em parceria com a New Balance, com a colaboração da Last Lap – Eventos e Comunicação e o CCD 477 Oeiras e que conta com o apoio da Água Serra da Estrela, Gatorade e a Peugeot Sucursal.

Ficas depois a saber que houve 7849 chegados à meta, que havia preços de inscrição crescentes à medida que o número de inscritos aumentava, que houve treinos de preparação organizados nas semanas que antecediam a prova, que irias receber uma t-shirt da New Balance e uma medalha se chegasses ao fim, que havia blocos de partida por tempos, animação, abastecimentos, possibilidade de tomar banho no final da prova, guarda-roupa, transporte gratuito entre a partida e a chegada, diploma que se pode tirar do site com o teu tempo e classificação. Que o percurso é linear, entre Algés e Oeiras, sempre ao lado do Tejo, que dá nome à Corrida. Que os dorsais são personalizados, com chip incorporado, que há controlo a meio do percurso. Ficas a saber que há atletas de topo e que a Corrida, com os blocos de partida até te permite caminhar se não tens condições para mais, mas és posicionado na cauda da partida. Que há 3 vagas de partidas. Que o percurso está totalmente fechado ao trânsito. Que os dorsais se entregam apenas nos dias de véspera da prova.

Ficas a saber tudo isto e pensas que sabes tudo. Mas não. Inscreve-te. Através do site da prova, fácil e rápido e sentes que, após esse esse último "clic", por impulso ou após profunda reflexão, acabaste de te comprometer. Com o Tejo, com a Corrida do Tejo e especialmente contigo! 

Treinas. Ou não treinas. Ou treinas muito pouco, como foi o meu caso. A organização promove treinos, fortalece-te a motivação ao longo das semanas. Para estares o melhor possível no dia da prova. Da tua prova. Aproveitas ou não.

Na véspera, ainda na 6ª feira ao fim do dia, vais levantar o dorsal, nas Piscinas do Jamor. Uma mini-feira, um último treino a decorrer, com a animação ao rubro, uma fila considerável  de gente para levantar o dorsal mas uma rapidez surpreendente e num instante estás na tua vez. Um saquinho de cartão do Município de Oeiras, uma t-shirt bonita, do tamanho que pediste aquando da inscrição, de boa qualidade, (não fosse New Balance!), e com corte feminino se fores mulher, o que é sempre um cuidado especial, que eu, como mulher que sou, muito aprecio, o dorsal com o teu nome impresso e o chip incorporado e 4 alfinetes, e ainda panfletos de publicidade e informações importantes para o dia da prova.

E já de dorsal ao peito, no domingo de manhã, deixo o carro em Oeiras, onde a meta está instalada, despeço-me do meu pai que me iria aguardar aí, e corro para a estação de comboio, que gratuitamente para todos os portadores de dorsal, faz o transporte até Algés, local da partida. Um mar de gente enche já o comboio, Quase todos para a Corrida. Já em Algés, aguarda-se agora a hora de partida. Um ou outro reencontro com amigos da Corrida e algum aquecimento. Pouco, que isto é para partir e acabar nas calmas, penso. Entro no bloco dos Sub 60, justificadíssimo pelo tempo feito na distância durante o último ano, mas sabia bem que acabar abaixo da hora seria já um bom feito para mim actualmente. Aliás, fazer a prova sem ser obrigada a caminhar era o meu objectivo, que não cheguei a concretizar. Mas na hora da partida sonhava com 59m59s e acreditava que estavam ao meu alcance. 

A animação é muita a contrastar com as águas serenas do Tejo mesmo ali ao lado. Já vem de longe o Tejo, mais de 1000 Km e está cansado. Apazigua as lutas travadas até aqui chegar e agora, corre serenamente para o Mar e entrega-se nos seus braços por fim. A música desperta-me e o alvoroço agora é muito. Tempo de reflectir, de expelir o nervoso miudinho através de um saltitar de pés ou nuns últimos, curtos e breves alongamentos.

Já está cheia a caixa de partida. É dada a 1ª partida (1ª vaga) e dali a 5 min, é a nossa partida. Imensa gente mas é sempre possível correr. E eu corro! E como me sinto bem a correr! Muita animação pelo caminho. Uma avenida cheia de corredores, completamente fechada ao trânsito. Marcadores de ritmo. O dos 60 min vai ali perto à minha frente, sempre à vista...até o perder de vista, ainda antes de metade da prova feita. O Tejo a correr ao nosso lado. Paz. Alegria. E  serenidade roubada às águas do Tejo, que no bulício da Corrida, me conseguem contagiar e me invadem de paz. Os meus olhos nem sempre pousam nele, mas sei-o ali e eu corro com ele. Com o Rio Tejo! 

Está muito calor e surge em boa hora um abastecimento de água. Música a tocar ao vivo. Chuveiros de água para refrescar. Vou muito bem sensivelmente até meio da prova (passei aos 5 Km com 31min) mas depois...houve por ali qualquer coisa que morreu em mim. A força! A força que uma preparação adequada me teria dado, não estava a ser suficiente para que eu conseguisse manter uma passada de Corrida, por mais lenta que fosse. Caminho, e partir daí até à meta, caminhei alguns períodos, mais do que queria. E estava calor. E aquela marginal, não é plana, já todos sabemos, com excepção de quem só lá passa de carro. E aí quando eu estou a  afundar-me, eis que surge mais um chuveiro para nos refrescarmos. E recomeço a correr. E quando de novo penso em caminhar, um animador, e eles eram tantos, nos gritam: "façam isto por vocês, vocês conseguem, vá lá, façam isto por vocês!!" E se alguém estava "esquecido" da razão que o levou ali, foi de imediato chamado à terra, e o passinho lento de Corrida foi mantido. Não faltou água (2 abastecimentos durante a prova) nem os chuveiros para referescar. E assim, devagarinho, alternando Corrida e caminhada, vou alcançando as placas dos kms, avisto o meu pai e a meta já não estará longe. Sinto que o apoio foi imenso. Muitos animadores, música ao vivo, e muitos atletas. Nunca estamos sós. Por fim, passo ao lado da meta, mas ainda tenho de ir à rotunda dar a volta e aí sim, entrar na recta da meta. Três cronómetros distintos, cada um a registar o tempo de cada vaga de partida. Muita gente e muita animação. Corto a meta! Estou exausta. Feliz por ter conseguido terminar apenas. Temos água, uma peça de fruta e Gatorade. Dão-nos uma medalha, muito bonita, uma medalha de peso, verdadeiramente à altura da Corrida do Tejo. Mas...então mas tem de haver um "mas"?! As pessoas nunca estão contentes, bolas! Bem...eu estou contente! Mas acho que se a medalha nos fosse colocada ao pescoço tinha outro valor e outro sentido, completamente diferente de ser dada com a fita meticulasamente embrulhadinha dentro do saquinho de plástico em ambiente perto do esterilizado, feito à medida. Esta agora! Mas tens sempre de reclamar? Não, eu não estou a reclamar! Estou apenas a sugerir outra forma de entregar a medalha aos finalistas, uma forma bem mais carregada de simbolismo, que nos faz sentir vencedores, gesto que valoriza o nosso esforço e nos faz sentir merecedores, mas isto é a minha opinião, que também valorizo as coisas aparentemente insignificantes. 

E meta cortada, reencontro amigos da minha equipa, foto tirada e é tempo de procurar o meu pai e rumar para casa.

Fui o 5188º participante a cortar a meta, com o tempo de 1h07m47s de um total de 7849.

Esta custou-me sobremaneira. Remete-me  à reflexão e reprogramação de todo um estilo de vida levado ultimamente, e leva-me à promessa de querer voltar para o ano, melhor preparada, o que à primeira vista, não será nada difícil. 

Muitos Parabéns à Organização, a 38ª edição da Corrida do Tejo foi uma excelente prova. A permitir uma boa competição na frente e também cá pelo meio e cauda do pelotão. Uma prova para todos os andamentos, permitindo a todos usufruir da Corrida e das excelentes condições criadas para o fazer.

Não menos importante, a prova teve ainda uma versão para a pequenada, a Corrida do Tejo Kids, que decorreu no sábado no Jamor, em que as receitas reverteram totalmente para a David Vaz Associação, associação cuja missão se prende com a promoção da amizade, do desporto inspirado na ética e na solidariedade, e do encorajamento a apoio de projetos de investigação no âmbito da oncologia. 
Mais uma vez, os meus Parabéns à Câmara Municipal de Oeiras por ter elevado a Corrida do Tejo ao nível da excelência.

Ana Pereira

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Algumas imagens:

Antes da Partida, junto à entrada do bloco "Sub 60", quando acreditava que ia conseguir:

A Partida:
Foto da Organização

Foto da Organização

Foto da Organização

Foto da Organização

"Estação" para refrescar, durante o percurso, uma de entre várias existentes:


A meta já não está longe mas eu vou que não posso...

Meta cortada, aqui junto aos amigos da equipa: Runners da Frente Ribeirinha da Póvoa de Santa Iria











O video da chegada, para ver aqui, minuto 43:27

Até para o ano Corrida do Tejo!