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sábado, 19 de setembro de 2015

39ª Meia Maratona de São João das Lampas

por LUÍS NUNES

um estreante na Meia Maratona de São João das Lampas


"Quanto à prova em si, inscrevi-me algo por impulso, porque queria fazer uma prova longa de estrada em Setembro para preparar o que me espera em Outubro, desafiado por alguns amigos que já a tinham feito antes. "É giro", " É diferente das outras meias", "É durinha, tem um bocadinho de desnível", " É um desafio engraçado, vais gostar"... E bem me levaram à certa, "é diferente, é um desafio", quem me conhecer minimamente perceberá que assim não foi difícil. Não foi difícil convencerem-me, entenda-se, já a prova, isso é outra conversa.
A prova...? Ora bem, grande parte de vocês já correu pelo menos uma Meia-Maratona, alguns já fizeram muitas e muito mais distância, alguns vão estrear-se este ano na Rock'n'Roll mas já fizeram a distância, ou mais, em treino. Portanto, "mais uma, nada de novo". Pois. Estão a ver as Meia das pontes, Vasco da Gama e 25 de Abril? O percurso da dos Descobrimentos, aquela planura que já nos é familiar ali entre Belém e a Expo? Estão a ver bem? Nada a ver. Atenção, nada a desfazer na dificuldades das provas de estrada no terreno mais plano possível, aliás, esse é um requisito para contarem para os campeonatos e os recordes e essas coisas todas com que se rala só aquela elite que nós vemos cortar a meta quando ainda temos só que ir ali fazer mais uns 7 ou 8km's e voltar...
A prova corre sempre em meio rural, entre S. João das Lampas e outros lugares e aldeias da freguesia. Sempre em alcatrão, afinal é uma prova de estrada. E o "problema" está ai. Nunca tinha corrido uma prova de estrada com tantas subidas (e descidas, também, mas eu apostava que são mais subidas). E ia mais ou menos avisado, eu e o Vítor ainda vimos, antes da partida, um gráfico de altimetria absolutamente assustador, mas desvalorizámos porque estava mesmo muito condensado na horizontal... No papel. Depois na estrada valorizámos mais um bocadinho... Vá, vou tentar ser mais realista e menos queixinhas, são só 266m de desnível positivo acumulado - um treino típico de trail ali Monte Serves e fazemos facilmente 350m em 10km. Só que aquilo não é um treino ou uma prova de trail. Não paramos para comer uma barrita, beber uma água, tirar uma fotografia, esperar para reagrupar, ver a paisagem e o nascer do Sol no Tejo. É estrada, e na estrada queres correr o que der para correr. Vais picado com a molhada de 600 pessoas a correr numa estrada estreita, vais picado com o grupo da frente que consegues ver durante uns bons km's, vais picado com o tempo que sabes que consegues fazer naquela distância, vais picado com aqueles km's mais rápidos e queres aproveitar os outros para não estragar muito a média, vais picado com aquele gajo - que às vezes é um senhor de 60 anos bem contados - que te passa nas descidas, e queres passá-lo nas subidas e... As subidas. Nas subidas queres correr ao ritmo a que corres em plano, e aquilo sobe, sobe a valer. E pensas: "se isto fosse um trail, íamos aqui todos a andar, o primeiro andava e o resto da malta perdia a vergonha". Mas ali a malta continua a correr, e tu queres correr na frente deles, ou pelo menos não muito atrás, e puxas mais um bocado, que raio, são só 21, já fizeste isto tantas vezes.
Pronto, já vos assustei? Era mesmo só para assustar, porque não vieram connosco. Se tivessem vindo, teriam visto uma organização popular, "caseira", que faz ver a outras muito profissionais (ou profissionalizadas). Placas com informação desde que se entra na freguesia, estacionamento em "parque Atletas" a dar "aquele estatuto". Secretariado que deve ter entregue a grande maioria dos dorsais em cima da hora da prova sem, que eu visse, grandes filas nem confusões. Uma partida de mais de 600 atletas numa estrada relativamente estreita, sem grandes apertos nem empurrões. Pelo menos 4 abastecimentos, água com fartura a cada 5km e banana num deles. Duches montados - em vários pontos, pelo menos uns 4 - a sair dos quintais para a estrada, para refrescar do calor que em Sintra não costuma ser aquela coisa, mas que souberam muito bem. Imensa gente na rua, dos mais novos aos mais velhos, a aplaudir e a apoiar do primeiro ao último km, avós à janela e netos a estender a mão para os cumprimentares ou a correr para te acompanhar por uns metros, o senhor que repreende o cão que ladra com um "xiu, respeitinho, que os senhores vão a correr!" ou que oferece uma imperial à porta do café, se quiseres fazer uma pausa, "vais em 5º, 5º ou 6º não vai fazer grande diferença!", uma faixa que dizia "a gente destas 4 aldeias saúda-vos". Placa indicativa a cada km, informação de "abastecimento a 100m". Dois controlos de passagem, fotógrafos por todo o lado, vídeo da partida e algo mais, filmagem com drones. Tempos online disponíveis praticamente na hora e diploma digital. T-shirt técnica bem porreira, uma meta toda janota e engalanada, uma medalha bem bonita, mais água, melancia, banana, batata frita, bolos secos, massagens, duches. E ainda dá para deixar a família a comer farturas ou queijadas e andar nos carrosséis da festa da aldeia, enquanto se vai correr no outro carrossel. Inscrição? 10€. Comparar isto com algumas provas populares que vemos por aí, ultra-patrocinadas, e tirar o chapéu, sff.
A prova é dura? É. Para uma prova de estrada, sim, é bem durinha. Não é prova para ir procurar um record pessoal em relação a uma Meia de estrada "normal", a não ser que tenha sido há bastante tempo e com bastante treino pelo meio, a incluir muitas rampas para treino de força (não sabe bem, mas faz bem). É que só depois de a correr é que soube é carinhosamente apelidada de a " Meia-Maratona de S. João das Rampas".
Não, não é uma Meia como as outras. Dito isto, é uma prova como as outras, pode correr bem ou mal consoante o treino, a preparação e a condição de cada um, mas é muito principalmente uma questão de ritmo, e de ter noção de que o esforço não vai ser constante e, portanto, tem que ser gerido. Mas também é destes desafios em que há tempo para as coisas acontecerem que se traz histórias para contar, em que se fortalecem laços e motivações, e em que percebes porque estás ali feito tolo a correr mais do que consegues para chegar ao mesmo sítio de onde partiste há uma hora e tal, bem mais cansado, mas um pouco mais rico.
Para mim, foi uma tareia. Mas foi uma tareia muito boa, e hei-de voltar. Assustei-vos? Calha bem, para o ano a prova faz 40 anos (é obra!) e acho que merece bem uma excursão."

Luís Nunes