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segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

O sino da minha aldeia

O sino da minha aldeia(*) dá as seis badaladas. Hora de largar a labuta que trará o pão no final do mês às formigas que alimentam e suam a cidade, tornando-a viva no seu frenesim de ir e vir carregando para o formigueiro. Descem a calçada já húmida da noite que entra, dando outro cenário e outras personagens ao palco da capital.

Apanha o barco, atravessa o rio e passa… para a outra margem. A sul. Vai para a fila do autocarro. Apanha-o. Desce na sua paragem. Olha o relógio. Já não passa pelo minimercado para comprar pão e leite, que faltam em casa, mas ainda chegam para amanhã.

Vai a casa e a correr muda de roupa e calça os ténis. Antes de sair, apanha a roupa estendida no arame e mete-a no secador, já que a partir de agora, só humidade da noite apanhará. Tira um bife do congelador para quando voltarem, enche uma garrafa de água, coloca uma toalha ao ombro, veste o colete reflector e entra no carro. Vai para o local de treino. Um local qualquer na margem sul. Pára no caminho pois tem de pôr combustível no carro. Paga. Segue viagem até ao local escolhido e possível.

Breves alongamentos e são 19:40 Hrs. Dá início ao treino. A correr, corre no único tempo que lhe resta: 40 minutos. Rápido. Respiração ofegante. Dói-lhe o tórax, dói-lhe tudo: pulmões, esófago, diafragma, fígado, ela sabe lá! Deve ser do ar frio. Não se sente pesada, ESTÁ pesada. E custa-lhe respirar. E corre. Quer despachar-se! Tem a filha a sair da aula de patinagem, que podia ser de outra coisa qualquer, e corre, e ainda bem que vai só pois se tivesse companhia não conseguiria falar.

40 minutos. Pára o cronómetro. Gasta entre 3 a 5 minutos em alongamentos, dá uns golos de água e o carro dirige-se velozmente para o clube onde a filha a espera. Explica sinteticamente o seu estado aos pais e mães que a interrogam sobre o equipamento e “arzinho” que ela deve apresentar, e ignora os que a olham de lado.

- Porque estás assim vestida? – uma menina pergunta com a frontalidade típica das crianças que infelizmente tem tendência a desaparecer com a idade, salvo raras excepções.

- Porque estive a correr perto da estrada e é para os carros me verem bem. – responde-lhe.

A pequena não se dá por muito satisfeita, pois continua a fixá-la com um ar perplexo, mas não há tempo para mais. Os pais que lhe expliquem. Há que pegar na mochila e na sua própria pequena e regressar a casa onde a labuta continua.

Por fim, noite dentro, deveres cumpridos (os imprescindíveis), banhos tomados, barrigas cheias, o silêncio na casa conforta-a num abraço que hoje não é frio. A pequena dorme, e o sossego e a paz (que nem sempre teve) dão-lhe um conforto e um bem-estar que sem dúvida se deve também àqueles 40 minutos em que a correr, correu.


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Esta história nada tem de invulgar, original ou especial. Podia ser acerca de qualquer pessoa. Qualquer mulher ou qualquer homem.

Mas é acerca de mim. Fui eu que hoje corri a correr e fiz 40 minutos
.

(*) – Igreja dos Mártires, em Lisboa, onde Fernando Pessoa foi baptizado

6 comentários:

Lénia disse...

O que é preciso correr para se fazer umas corridinhas, hein?

Mas é assim que se revelam as grandes mulheres.

E quando chegarmos aos 60 anos, as senhoras mães das meninas da patinagem que te olharam hoje de lado, vão estar decrépitas, a queixarem-se das dores de cada vez que têm de subir meia dúzia de degraus. Mas tu não, irás a saltitar ao lado da tua bonita filha, já mulher feita, de sorriso na cara e dando graças pelo respeito, amor e cuidados que prestaste ao teu corpo e mente durante toda a vida.

É assim. Aqui se fazem , aqui se pagam. eh, eh, eh

Ana, está combinado? Daqui a 20-30 anos ainda andaremos por aí fresquinhas que nem duas alfaces, a correr pelas ruas e a abanar o esqueleto.

Beijinhos e um bom dia para ti.
E acredita, que não estás sozinha.

Jorge Cerqueira Souza Filho disse...

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-ooO--(_)--Ooo—
Bom dia minha amiga Ana, muito obrigado pela msg, chamei a minha filha Bruninha e mandei ela ler e pediu que lhe agradecesse. Amiga realmente eu fiquei fascinado no sábado passado pq nunca tinha visto antes 600 crianças reunidas em prol do atletismo, Ana vc precisava ver a garra das gurizadas, fiquei impressionado pq as mães levaram seus filhos lá tinha crianças especiais, crianças com síndrome de down e crianças caldeirantes.foi um maior barato.
Ana, muito legal a sua cronica que vc relatou do seu treino dos 40 minutos parabéns, sensacional, amiga eu nem precisava dizer aqui né a nossa amia Lênia acima já disse tudo...risos...
Desejo a vc uma ótima semana e com bons treinos.
Bjs
www.jmaratona.blogspot.com
JORGE

Anónimo disse...

Olá Ana,

Ainda bem que vais treinando. Não te preocupes se treinas só duas ou três vezes por semana, se estás com mais 1 ou 2kg (por vezes depende do nosso organismo ou até da altura da época do ano).

O que interessa é encararmos o desporto sem stresses do tipo, não bebo isto porque...não como este bolo ou estas batatas fritas porque...Come o que o teu "eu interior" te pedir, diverte-te! Treina também num ritmo descontraído, em que te saiba bem correr e não te esgote fisicamente. Mas porque te estou a dizer isto? Eu se aumento 2 kilos ninguém já me pode aturar e fico logo a pensar que vou fazer mais 1 min. aos 10 kms, me vão passar uns 10 atletas, etc. etc.

Pois é, eu estive quase a desistir de correr e por pouco que isso não aconteceu. Mas hoje enchi-me de força de vontade e já corri de manhã. Custou-me imenso a coordenar a respiração, o ritmo... e neste momento estou com dôres nos tornozelos e nas coxas. Não treino desde o dia 7 de Janeiro pois apanhei gripe. A tosse ainda por cá anda mas como quero ir ao GP de Queluz no próximo Domingo obriguei-me a ir treinar um pouco.

Como conclusão até achei que esta pausa me fez bem, foram umas fériazitas daquelas que gostas de fazer não é Ana?

Tudo bem para ti
Beijinhos
Fernando Sousa

Anónimo disse...

Olá!!!!!Obrigada pela visita!! É verdade que tenho andado muito parada, mas isso deve-se a uma excelente fase a minha vida que agora começa, uma "corrida" gigante...pois é, estou grávida!!! Mas não podendo correr vou fazer de motorista aos meus pais e ao marido(ele só de vez em quando, hihihi).Vamos estar na de Sintra e de Cascais, obviamente nas minis. Se me virem faz favor de me cumprimentar, vou adorar conhecer as pessoas que visito!!! Uma grande beijoca e continuação de bons treinos!!!!!! Rosa Alexandra

Anónimo disse...

Olá, Ana
Fez-me lembrar a "Calçada de Carriche do Gedeão :

Luísa sobe,
sobe a calçada,
sobe e não pode
que vai cansada.
Sobe, Luísa,
Luísa, sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.
Saiu de casa
de madrugada;
regressa a casa
é já noite fechada.
Na mão grosseira,
de pele queimada,
leva a lancheira
desengonçada.
Anda Luísa,
Luísa sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.

Luísa é nova,
desenxovalhada,
tem perna gorda,
bem torneada.
Ferve lhe o sangue
de afogueada;
saltam lhe os peitos
na caminhada.
Anda Luísa,
Luísa sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.

Passam magalas,
rapaziada,
palpam lhe as coxas,
não dá por nada.
Anda Luísa,
Luísa sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.

Chegou a casa
não disse nada.
Pegou na filha,
deu lhe a mamada;
bebeu a sopa
numa golada;
lavou a loiça,
varreu a escada;
deu jeito à casa
desarranjada;
coseu a roupa
já remendada;
despiu se à pressa,
desinteressada;
caiu na cama
de uma assentada;
chegou o homem,
viu a deitada;
serviu se dela,
não deu por nada.
Anda Luísa,
Luísa sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.

Na manhã débil
sem alvorada,
salta da cama,
desembestada;
puxa da filha,
dá lhe a mamada;
veste se à pressa,
desengonçada;
anda, ciranda,
desaustinada;
range o soalho
a cada passada;
salta para a rua,
corre açodada,
galga o passeio,
desce a calçada,
chega à oficina
à hora marcada,
puxa que puxa,
larga que larga,
puxa que puxa,
larga que larga,
puxa que puxa,
larga que larga,
puxa que puxa,
larga que larga;
toca a sineta
na hora aprazada,
corre à cantina
volta à toada,
puxa que puxa,
larga que larga,
puxa que puxa,
larga que larga,
puxa que puxa,
larga que larga.
Regressa a casa
é já noite fechada.
Luísa arqueija
pela calçada.
Anda Luísa,
Luísa sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada,
sobe que sobe,
sobe a calçada,
sobe que sobe,
sobe a calçada.
Anda Luísa,
Luísa sobe,
sobe que sobe,
sobe a calçada.

Fernando Andrade

António Bento disse...

esses 40m já estão. fazem parte de si porque já os conquistou. seguem-se os próximos.
força nisso! até breve
um bjinho
ab