O elevador desce. No Piso zero aguardam-no calmamente um enfermeiro vestido de branco, alto e forte, de rosto reluzente e de abdómen proeminente, onde a camisola branca estava já amarelada denunciando o mau hábito de afagar aquela zona corporal, talvez mesmo por se orgulhar dela, ou talvez por ela , devido ao seu vasto perímetro e involuntariamente, encalhar em tudo e em todos e seja por isso difícil evitar a acumulação de sujidade e transpiração especialmente naquela área, dando ali uma feia tonalidade amarelada. Descansa as mãos sobre uma maca que transporta um doente ligado, de boca entreaberta e olhar perdido num horizonte imaginário.
Quando o elevador chega e as portas se abrem, sai de lá um funcionário de bata verde que traz dois contentores do lixo, também eles verdes. Estes saem e dão lugar aos primeiros e o elevador volta a subir.
O elevador desce de novo. No piso zero, onde ela está, sai um doente numa cadeira de rodas, uma perna amputada, um braço inerte pousado no colo, mas com os outros dois membros funcionais que lhe restam, manobra a cadeira com uma perícia admirável. Passa a porta, deixando cerca de 3 mm de cada lado que é o espaço exacto para a cadeira passar, dirige-se à máquina do café, introduz as moedas, retira um cigarro do bolso do pijama e coloca-o atrás da orelha, tudo só com um braço, retira o café e manobra a cadeira até ao átrio na rua onde como ontem e anteontem irá degustar o café e o cigarro depois do seu jantar.
Ela distraiu-se com esta rotina e eis que o elevador desce de novo. Ao chegar ao piso zero, as portas abrem-se e desta vez o elevador está vazio. Uma brincadeira ou engano de alguém que o chamou indevidamente. O elevador volta a fechar as portas e por instantes parece que nada se passa. Só existe o cinzento metálico e frio das suas portas a fitarem-na a ela agora.
O Pai continua internado, e ela hoje não correu.
Até amanhã querido diário
8 comentários:
As melhoras do pai, Ana
Beijinhos e tudo a correr pelo melhor
Desjo que o Melro recupere depressa, não é ali o lugar dele. Espero por ele de novono Parque e a sorrir.
Um beijinho do Pára.
Aí está a Ana ao jeito de Robin Cook, o mestre das histórias de suspense em ambiente hospitalar.
As melhoras do Melro, para quem mando um grande abraço.
Beijinho, Ana
Você já pensou em escrever profissionalmente? Você escreve muito bem!
Ah, e melhoras para o pai! Conseguiste me distrair totalmente da doença do seu pai com seu maravilhoso texto!
Olá Ana, só agora vi as novidades, então o teu pai? já sabes o que é que ele tem?
Eu estive fora e só voltei hoje, espero que esteja tudo bem contigo e que o teu pai já se sinta melhor.
Beijinho para ti e para ele
Olá Ana, espero que nesta altura o seu pai já esteja em casa.
De qualquer das formas continuação de rápidas melhoras, um abraço para o amigo Melro. Beijinhos Ana
Apinho
Aninha... desejo melhoras ao seu pai e que em breve ele esteja participando de seus treinos e provas....
beijinhos
Jacke
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