17 de Maio de 2014
Aprendemos todos os dias. Aprendo que os maiores desafios são os que a vida nos coloca e que sem anúncio ou aviso, surgem-nos à frente de repente, sem dia marcado na agenda, sem hora marcada para o tiro de partida, sem tempo ou hipótese sequer para pensarmos se o queremos agarrar ou não, sem tempo para treinarmos ou prepararmos o corpo ou a mente, sem meta à vista, sem noção da passada certa, do ritmo certo ou mesmo da direcção a seguir, com poucas certezas, e por fim sem classificação ou certeza alguma afinal. A única coisa a fazer é enfrentar e seguir em frente, fazendo como podemos e sabemos, o nosso caminho.
Não terá sido este o caso da Corrida Espírito de Aliança. Uma Corrida que liga Lisboa a Mafra, num percurso de 100 Km, maioritariamente em trilhos e caminhos de terra, pelas Históricas Linhas de Torres, Corrida-convívio, sem classificações ou prémios, com ritmos rigorosamente controlados, dividida em 12 etapas, estimando-se a sua chegada a Mafra às 8 da noite, precisamente 15 horas depois do tiro de partida, em Lisboa.
O Espírito é "a união de cidadãos por uma causa, de valores que se perpetuam no tempo e de laços que nos estão no sangue" - pode ler-se no site da Organização. Organização essa a cargo do Clube do Stress e pela Revista Spiridon.
A participação era permitida a todos, para a totalidade da distância ou apenas para algumas das 12 etapas que constituiam a prova, devendo para tal fazer-se um donativo mínimo de EUR 5,00 a reverter na sua totalidade para a Fundação Portuguesa de Cardiologia. A Corrida permitiu ainda atribuir 7 bolsas de estudo a jovens estudantes, uma por cada município integrado no percurso.
Este é o Espírito da Corrida e eu simplesmente ADOREI o Espírito!
A minha Corrida Espírito de Aliança
4:30hrs da madrugada e estaciono o carro em frente ao Instituto Superior Técnico. Já muitos atletas também. Vou estrear a mochila de hidratação acabada de comprar para a ocasião que se quer a primeira de muitas e levo o meu próprio abastecimento: água, gel e barras energéticas.
Conheço alguns atletas, não muitos. Isto é outro mundo e eu gosto!
Era minha intenção fazer "apenas" as 3 primeiras etapas:
- Lisboa - Sacavém (8,7 Km)
- Sacavém-Mata do Paraíso, Vialonga (10,4 Km)
- Mata do Paraíso - Forte da Aguieira (6,6 Km)
Correr àquela hora pela cidade adormecida, sempre acompanhados pela Polícia, chegar a Sacavém já com o Sol a nascer e 1ª paragem, fim da 1ª etapa. Espera-se que todos cheguem. Há os que ficam. Há os que continuam. E outros que aqui começam. Será assim em todas as etapas. Repor energias, comer, beber, descansar um pouco e seguir. A acompanhar os que desafiadora e corajosamente enfrentam os 100 Km.
Confesso que fui muito bem até à Mata do Paraíso, onde cheguei com perto de 20 km nas pernas e onde o meu pai estaria aguardando-me e onde o meu irmão prometera estar para me acompanhar até ao Forte da Aguieira e depois fazer-me companhia no caminho de regresso a casa, já só os dois, pois a nossa Corrida Espírito de Aliança acabaria nesse ponto.
Aqui está de novo todo o apoio da organização, certificando-se que todos chegam. Pelo caminho houve sempre policiamento nos pontos em que éramos levados para a estrada ou a tinhámos de atravessar.
Mas a entrada na Mata começa logo a subir. A partir daí é sempre a subir e a descer, e será assim até Mafra segundo contam que eu não sei mas gostava de vir a saber. Mas é também a partir daqui que a beleza se manifesta e se reforça a cada passo dado.
Porque o meu irmão chegou tarde, acabámos por ser os últimos a começar esta 3ª etapa. E eu já venho perto do meu limite e tenho de caminhar por vários metros. Aliás, daí ao Forte da Aguieira fui sempre a alternar Corrida com Caminhada. Fico sozinha e ao fim de cerca de 5 km lá está o meu irmão a aguardar-me. Seguimos no mesmo ritmo (corre-anda) até ao Forte onde nos esperam. E tenho já cerca de 26 km nas pernas (basicamente 1/4 da Corrida)
Mais uma vez a organização está 5 estrelas. Oferecem-me água. Sei que é só para os atletas dos 100 km mas eu trago uma garrafa de água vazia na mão e a mochila com água já morna e respondo "Posso?", ao que com toda a simpatia me respondem que posso e devo, ao mesmo tempo que me retiram das mãos a garrafa vazia e sinto algum reconhecimento nisso também. Sorvo a água e alinho na foto de grupo junto ao Forte. Já não sei do meu irmão. Está misturado connosco. Perfeitamente integrado no Espírito. Eu fico-me pelo sopé do grupo, as forças já me faltam para subir mais. Mas estou feliz.
Foto tirada e o grupo prepara-se para retomar agora a 4ª etapa. Nós seguimos os dois, agora de regresso a casa, mais caminhada que Corrida. Chego a casa às 10:00 hrs da manhã, precisamente 5 horas depois do tiro de partida e com cerca de 35 Km nas pernas. Estou toda partida mas estou bem.
E quero voltar para o ano. Sonho com os 100 Km mas ficarei contente em percorrer "apenas" meia dúzia de etapas. Outras etapas. Conhecer outros caminhos. Conhecer outros Fortes. Correr. Participar. Contribuir. Este ano corri 3 etapas. Para o ano quero continuar o caminho. Este é o Espírito.
Parabéns à Organização e a todas as entidades que de alguma forma contribuíram para esta Ultra-Maratona com um Espírito tão especial. O da Aliança. Ver-nos-emos de novo para o ano.
Algumas imagens:
O grupo no Forte da Aguieira:
A Andreia que correu até ao km 46 - foto do Georunner Antonio Costa |
Foto ilustrativa da 3ª etapa - foto da edição do ano passado:
Também a 3ª etapa (em sentido contrário, que eu fiz com o meu mano no regresso a casa):
3 comentários:
Tudo tão bonito!
Pode ser que para o ano também vá fazer uma "perninha"!
Também eu sonho com os 100 km (que para mim não seria uma estreia mas foi há tantos anos que era quase como se fosse), aliás eu sonho com muitas coisas, demasiadas coisas....
Mas sonhar é uma coisa ter pernas é outra! Mas pelo menos antes de me "reformar" queria fazer uma coisa maior! Quem sabe se será nessa corrida solidária que tem o selo da Spiridon logo o sela da qualidade e de uma amizade de longos anos!
Vamos ver o que esqueleto dá.. e vamos sonhando.... Mas se a "piquena" pensar nos 100 km diga alguma coisa, quem sabe tem companhia para uma parte desde que não aplique eu seu famoso andamento Queniano! Beijinhos.
Olá Ana,
Eu ainda pensei em fazer as primeiras etapas também mas...a preguiça...e o sono...
Talvez para o ano faça uns kms.
Entretanto, gostaria apenas de fazer uma sugestão que poderia levar mais atletas a participar. Sendo uma corrida que tem o apoio da GNR, porque não ter um meio de transporte (poderiam cobrar uns € pelo transporte) tipo camião da GNR, a acompanhar a corrida? Este iria estar no final de cada etapa onde recolheria os atletas que não pudessem ou quisessem correr mais...estes poderiam descansar durante algum tempo e quem sabe se não voltariam a correr numa outra etapa, a última por exemplo? Teria um espírito mais de "aliança" em que todos os participantes, mesmo aqueles que só tivessem corrido uma etapa pudessem estar no final da corrida.
No final, o camião da GNR poderia regressar a Lisboa ao local da partida (podendo passar por outros locais relacionados com o inicio das etapas) e com os atletas que assim o pedissem, para irem buscar os seus carros.
Bjs.
Fernando Sousa
Gostei bastante de fazermos em conjunto a primeira etapa desta prova, e as outras etapas que fiz, foram também muito boas, apesar de exigentes.
Espero voltar para o ano, e espero também poder continuar a correr.
Fernando Varela
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