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quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Foi a senhora que...

O telemóvel toca a meio da tarde. Número identificado, também de telemóvel, mas no entanto desconhecido desta rapariga e portanto não constante da sua lista de contactos.

Deve ser mais alguém para o autocarro para a Maratona do Porto, pensa. Daqui a nada, acabam-se as vagas, pensa satisfeita.

- Estou? - atende.
- Estou sim, boa tarde.
- Boa tarde - responde.
- É a senhora Ana...blá...blá...blá...Pereira? - não chega a intimidá-la a forma de abordagem, utilizando o nome completo dela, incluindo a preposição "de" que faz parte do nome dela, mas não deixa de lhe suscitar uma curiosidade aguçada.
- Sim, sou.
- Foi a senhora que no dia 13 de Setembro de 2013 entregou um cadáver....(blá blá blá blá...)

A conversa continuou e acabou por fazer sentido, mas naquele instante a mente dela estancou ali.

Um cadáver? Um mamífero carnívoro da espécie canina? Um monte de carne e pêlo denominado canídeo? Uma massa a entrar em decomposição? Um cadáver num saco preto?!

Eu entreguei a Cindy, a nossa Cindy...que esteve connosco o tempo de uma vida, pensa. Eu entreguei a Cindy...não um cadáver!

Sem o interlocutor dar conta, por instantes passou-lhe uma vida pela mente, a recordação da amiga peluda, os dias felizes, os últimos dias tristes doridos... a vida, a despedida, a morte.

Depois, como a maior naturalidade do mundo, retomou a conversa num tom casual e desprovido de qualquer emoção:

- Sim, sim, fui eu. - e estranhamente a frase soou-lhe a confissão, a profissional ou assassino que assume uma acção com frieza, clareza e rigor, pronto e preparado para as consequências que de seus actos advêm.



6 comentários:

Jorge Branco disse...

(com as minhas desculpas mas só consigo escrever isto) BARDAMERDA!
Mas se fosse comigo a resposta ainda teria sido pior que isso...

Anónimo disse...

Olá Ana,


Acontece-nos cada uma...mas é a vida. Existem pessoas que não são nada sensíveis, deviam ter mais cuidado com os cargos e tarefas que têm para assim não ferir susceptilidades alheias. Esquecem-se de que existe alguém que ainda é capaz de amar o próximo (incluem-se os nossos animais domésticos). Estes por vezes parece que nos amam mais e respeitam que o nosso parceiro...escolhido).
Mas no que diz respeito a escolhas, vá menina Ana, vamos a treinar para a Maratona pois ela aproxima-se...vá lá! Força!

Bjs
Fernando Sousa

S* disse...

Que falta de sensibilidade!!!!

Corre Piolha Corre disse...

Á certas pessoas que por mais que tentem não conseguem ter setimentos pelos nossos melhores amigos de 4 patas!
Alguém que faz esse serviço deveria ter cuidado em lidar com a pessoa do outro lado, uma abordagem mais cuidada...
Não estamos a falar de uma lagartixa, nem de rato, estamos a falar dos nossos melhores amigs que infelizmente partiram. São nossos, e por serem nossos ferem-nos a alma quando os abordam dessa maneira.
É triste...

C. disse...

Há gente com sensibilidade de uma porta, credo! De certeza que nunca chorou a morte de um amigo de 4 patas :(

Lilith disse...

infelizmente temos que lidar com gente insensível e com burocracias que tratam tudo e todos como simples números... Resta-nos respirar fundo e ignorar :)

beijinhos