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segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

"Solidão" ou "Eu e esta cadeira"

Por fim, depois da curta visita, que tardara mais que o necessário e desejável, com os seus olhos pequeninos e claros, por trás das lentes dos óculos, desviou o olhar, libertando-nos dele e focou-se no que parecia ser a imensidão do vazio: "Vocês agora estão aqui, comigo entre estas quatro paredes, mas estão a ver aquela cadeira? Agora vocês vão embora, fecha-se esta porta e eu aqui fico. Entre estas quatro paredes, eu e esta cadeira". Solta uma gargalhada envergonhada e triste e continua, com a mesma doçura na voz, mas agora carregada de tristeza e dor. "Não faz mal, é assim...a vida...eu e esta cadeira, ficamos para aqui...sozinhas...eu e esta cadeira...".

Agora, aproxima-se mais um Natal e eu recordo bem os Natais em que me enviavas brinquedos, de lá, do Ultramar, e postais, sempre lindos, com paisagens exóticas, e ilustrações com realidades tão distintas da minha, que me faziam sonhar. Nos meus aniversários e noutras ocasiões, sempre que terias vontade e podias. Escassas as palavras, mas sempre carregadas de amor e carinho, atravessavam o Oceano desde o teu coração e chegavam ao meu, cravando-se aí, guardadas até hoje. Nem tanto as palavras mas sim inequivocamente o amor, que vencia distâncias, atavessava o mar e chegava até mim.

Recordo o tempo em que eu era menina de colo e tu me carregavas e embalavas.

Os passeios que dávamos quando eu era menina e já corria traquina, pelo campo entre as flores, saltitando entre riachos, equilibrando-se nas pedras, sentindo a terra, inalando o perfume da vegetção e sendo feliz. (Acho que vem dai o meu gosto pelas incursões pelo campo e pela Natureza, correndo e saltando). O passeio ao Jardim Zoológico, o baloiço que ajudavas a embalar. A ajuda que sempre me davas para descer ou subir muros ou sempre que alguma dificuldade se me deparava. A mão dada, o consolo e o mimo, o afago no rosto e a lágrima limpa com a tua mão macia, sempre a cheirar a creme Nívea, e a doçura na voz que ecoa clara ainda hoje na minha cabeça como se estivessemos lá, nesse tempo guardado na memória, há quase cinquenta anos atrás. 

Sempre a tua palavra amiga, o carinho, o amor, o bem-querer, sempre comigo ao longo da minha vida desde que nasci. De uma forma ou outra, acompanhaste-me a minha vida inteira e eu...sinto-me abençoada e grata por isso. 







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