- Mãe, estiveram cá em casa? - pergunta ela ao telefone, dois minutos depois de ter entrado em casa.
- Não. - responde a mãe do outro lado da linha - Mas tens alguma coisa mexida? Falta alguma coisa?
- Não, mexido não, mas...falta... falta o cocó da Molly.
- O quê?! - interroga a mãe incrédula e pasmada com a resposta da filha.
- Sim! É que ela anda de diarreia, e estão duas manchas redondas no chão do terraço, já secas, mas o estranho é que da mancha só restam os rebordos pois o seu interior está tão limpo quanto o resto do terraço, como se alguém tivesse tirado o cocó do centro e ficasse apenas os contornos da poia que quando caiu era por certo praticamente líquida e entretanto o rebordo secou mais rápido e agarrou-se ao chão. Já espreitei o terraço do vizinho, o cão dele também anda de diarreia, tem o terraço todo cagado, mas as poias estão inteiras, redondinhas e escuras, intactas, e secas, coladas ao chão.
- Ok filha, obrigada mas dispensava a descrição tão pormenorizada, mas não, não estivemos aí. Se calhar ela comeu!
- Nãa... não! - a rapariga olha para a cadela, que abana a cauda com um ar feliz e olhos brilhantes, a transparecer a mais pura inocência e alguma agitação pois sabia ser aquela a sua hora de ir à rua.
Depois de desligar, a rapariga passa a esfregona e água com lixívia nos vestígios das manchas, e por fim já com a trela posta na cadela, vão à rua. Tudo normal. Chichi aqui e ali, cheira aqui e ali, brinca com cães vizinhos, mordisca a erva, deitada de costas esponja-se na relva, deliciada e emitindo sons de intenso prazer. E voltam para casa. Tudo normal portanto.
Entra a cadela em casa a correr, vai para o terraço, como costume, onde bebe água, mas ainda nem passaram 20 segundos e a rapariga é surpreendida por um grunhido rouco que não é mais que um vómito. Ao espreitar o terraço está a cadela cabisbaixa e à sua frente um monte gigante (num diâmetro de mais de 20 cm!) de um líquido grosso castanho, povoado de pequenas aglomerações sólidas da mesma cor. Mas que raio de me*** é esta?! Não! Não é aquilo que estou a pensar! Enxota a cadela para a cozinha e de mangueira na mão, lava o terraço com jacto forte de água. Lixívia e água empurrada à vassourada e vigor. Findo o trabalho, volta a cozinha para deparar-se com nova mancha castanha no chão, desta vez mais pequena. Enxota a cadela para o terraço, absorve e apanha tudo com um trapo velho e coloca no lixo. Enche o balde com água nova e mais lixívia e lava o chão com a esfregona. Já no terraço há de novo, mais manchas de vomitado. Mais pequenas e mais claras. Persegue a cadela e limpa. A cadela vomita, a rapariga limpa. Os gestos repetem-se perto de uma dezena de vezes, até o líquido regurgitado ser apenas espuma branca amarelada.
Agora é fazer-lhe uma canja e esperar que passe. Senão, lá teremos de recorrer ao veterinário e abrir os cordões à bolsa.
É assim ter um cão. Muito bonito mas muito trabalhinho, contrariedades, arrelias e despesas. Tal qual como um filho. E tal qual como um filho, também muitas alegrias e muito amor. Amor dado e Amor recebido, a fazer-nos mais felizes cada dia da nossa vida. E isso, é o que se quer!