Da saga “Férias 2019”
Capítulo III
As férias e a Corrida
Agosto de 2019...lá para dia 8 ou 9
Como se fosse possível, depois da tua partida inesperada,
tentámos manter alguma normalidade e aproveitar as férias, o espaço e as
pessoas. Tal como tu gostarias que fizéssemos e como me recomendaste com amor, repetida
e insistentemente, alternando com pedidos de desculpa, ainda deitada na maca
naquele escuro corredor de Hospital, a tremer descontroladamente, sem qualquer
conforto ou fármaco para te aliviar as dores.
Assim, a par das viagens de 500 km para te visitar, com a
preocupação acrescida da eventual falta de gasóleo nos postos de abastecimento,
com que a comunicação social fazia questão de nos bombardear até à ridícula
histeria colectiva, continuámos a usufruir das férias. Da piscina, da Sol
quente, do descanso deitados na relva à sombra das árvores, da boa comida, da
companhia dos que restavam connosco, enfim…da Vida, e claro que a Corrida não
podia ser excepção. Lugares novos, com caminhos para explorar, como eu adoro.
No entanto, confesso que a vontade era pouca e o cansaço do corpo não
convidava.
Mas contrariando as "desculpas",
numa manhã, depois de escassas horas dormidas, depois dos pequenos almoços tratados,
compras feitas e almoço adiantado, lá me empurrei, equipei-me e saí para a rua
a correr!
E surpreendentemente (ou não), apesar dos caminhos secos e poeirentos,
do Sol abrasador, do asfalto a queimar os ténis e a devolver o calor à atmosfera
em ondas turvas à vista, corri com o original e genuíno prazer que a Corrida
sempre dá. A liberdade e o prazer de estar só comigo mesma, necessidade que se
impunha há muito, foi maravilhosa. Como banho de renascimento. Como baptismo
repetido e ainda assim reinventado, cada vez que corro. Apenas os montes em meu
redor, um ou outro cão ao longe, a guardar o seu monte, os olivais por onde me
aventurei, a proporcionarem algumas sombras, a sinfonia das cigarras que
claramente cantam com outro timbre no Alentejo, os rebanhos deitados à sombra
dos sobreiros, a paz, a plenitude, e eu e a Corrida. Naqueles minutos, nada
mais existe e de nada mais preciso. Momentos divinos estes os oferecidos pela
Corrida, de forma singela e a encerrar neles tanta beleza. Assim, a passo de
caracol, na imensidão do calor e paz deste nosso Alentejo, usufruí. Da Corrida
e da Vida.
Poucos quilómetros corridos, mas regresso à casa como nova. O
corpo, mais bronzeado, a luzir de suor sob o Sol escaldante, mais torneado e
firme, sob a ilusão que a Corrida nos dá, mais forte, cheio de energia, invencível
até, tal é a sensação ilusória que a Corrida nos dá. Mas claramente, sem
qualquer ilusão, mais feliz, mais segura e cheia de ânimo!
Uma alegria espontânea,
quase infantil, apodera-se de mim. Recebem-me com alegria na casa,
especialmente a cadela que não pára de abanar a cauda e de me lamber o rosto e as
pernas, não como manifestação de afecto como gostaríamos de pensar, mas porque
a transpiração lhe deve ser algo bastante apetecível ao paladar, enquanto alongo. Rio. Faz-me
rir a cadela. Faz-me rir a Corrida. Fazem-me rir os meus que me esperavam à
beira da piscina, onde e com quem, depois de um duche rápido, partilho mergulhos e brincadeiras com alegria e uma
energia que não sentia há muitos dias, no que se hão-de transformar mais tarde, em boas recordações destas férias.
E num mergulho, de corpo totalmente imerso a deslizar nas
águas azuis refrescantes, relembro-me que a Meia Maratona de S.João das Lampas
está aí à porta e que eu estou inscrita!