A Realidade e a Verdade
A realidade é tudo o que existe. A verdade é uma interpretação mental da realidade transmitida pelos sentidos. É a apreensão dos dados que nos são dados pelos sentidos. Também é verdade que a verdade de um, não é a verdade de outro. Porque apreendemos a hipotética realidade de forma diferente dos outros, de forma única, sujeita às nossas experiências, vivências e análises pessoais, por mais que as queiramos universais.
A 31ª Corrida das Fogueiras
É uma realidade que a prova se realizou pela 31ª vez, ao fim do dia 26 de Junho de 2010, com a organização da Câmara Municipal de Peniche.
É verdade que a corrida levou à meta 1849 atletas que percorreram a distância certificada de 15.000 metros.
É também verdade que não gostei nada de ter apenas metade da estrada para correr nos primeiros quilómetros, nem de ser atropelada pelos rápidos (?!) atletas da Caminhada de 6 Km, que colocou milhares a correr e a caminhar na noite penichense, iluminada e aquecida pelas fogueiras e pelas gentes, alegres, a ladear as estradas dentro da cidade.
Outras verdades da prova:
Uma animação organizada e popular muito grande. Partida a horas, quando o Sol já se pôs, e a noite caía. Cheira a carvão e a peixe e a mar. Peniche é uma terra bonita, muito bonita. Sobrevoam-nos as gaivotas, gemendo ou cantando, neste fim de dia enquanto aquecemos junto aos barcos ancorados ao cais.
Foguetes e partida dada. Corremos pela cidade, sendo rapidamente apanhados (quem partiu do fim do pelotão) pelos caminheiros que partem imediatamente a seguir, favorecendo uma maior moldura humana mas impedindo a Corrida de se desenvolver nos primeiros quilómetros (para os atletas de meio/cauda do pelotão) tendo em conta que se tem apenas metade da estrada para avançar. Com a consciência de quem faz quase hora e meia aos 15, aponto serenamente o erro que é manter apenas metade da estrada e permitir que a Caminhada saia imediatamente a seguir à prova principal, misturando-se nesta. Um coxo que corre 15 km tem direito a correr os 15 km, sem ser obrigado a parar por a estrada ilusoriamente afunilar devido ao elevado número de atletas.
A prova começa a partir do Km 6 quando se deixa o burburinho da cidade. Ficássemos ali e o encanto se esfumaria numa prova de massas, para as massas, onde a Corrida em si, fica para segundo ou terceiro plano em prol de imagens que se querem mostrar a patrocinadores e afins.
Percurso sempre bem marcado, delineado, seguro porque fechado ao trânsito, acompanhado, ainda com pontos de aglomerado de público, de muito apoio popular e da organização, fogueiras a guiar-nos, quando corremos ao lado do mar e salpicados pela maresia. Abastecimentos fartos de água. Anunciado o nosso tempo aos 10 km. Controlo por chip.
Camisola de qualidade técnica (?) para todos os participantes e medalhão. Ainda prémios por classificação.
Aplausos bem merecidos para a Câmara Municipal de Peniche. Que venha a 32ª edição.
Resultados
Confissões lá pelo quilómetro 12 ou 13 da Corrida das Fogueiras
Escuro. Asfalto. Passos no solo. Respiração ofegante. Músculos rígidos. Salpicos de mar e de suor no rosto e no corpo. O coração a bombear o sangue que corre o corpo e revigora os pensamentos, enchendo-os de luz na noite escura.
- António, deixe-me confessar-lhe uma coisa... há muito muito tempo que não me sentia assim tão bem.
- Isso é que é importante. "A gente" sentir-se bem!
Eu eu senti-me! Muito bem! Com força! Parti e depressa me fiz acompanhar do Pinho e do Torres, um trio que se espera repetir a 7 Novembro na Maratona do Porto. Depois de os ter avisado que provavelmente os ia deixar avançar, logo ao final do km 5, lá me consegui aguentar porque eles também abrandaram, e agora (km 10 ou 11), depois de deixarmos o Torres para trás, queixando-se de uma lesão já sua conhecida, eu e o Pinho seguimos juntos ainda. Com força.
Sigo muito confiante e forte. ("forte" significa aqui que vou bem e não me arrasto, o que não quer dizer de forma nenhuma que vá num ritmo forte! - só para o caso de não terem percebido). Falo. Confesso o meu bem-estar. Ali às escuras, a sentir o coração e a correr como uma gazela, com o mar e o vento e o luar na cara, confesso que há muito tempo não me sentia assim! Assim tão bem! Feliz. Plenitude. A correr para os que me esperam na meta. Feliz por os saber ali também. A correr por eles hoje! Também isso sim! É esta a minha Verdade.
E é verdade que gosto de correr ali! Gosto da noite, do ar, das gentes, das inclinações, do fogo, do mar... Peniche. Corrida das Fogueiras:
Um prato cheio de emoções, servido e consumido em 1h25m56s, que levo para casa e vou sorvendo devagar, a fazer durar, render, até nova refeição.
É verdade também que a Organização oferece sardinhas assadas no final da prova, num espaço onde é promovido o convívio. Desde há algumas edições, fujo da confusão e saio de mansinho. Admito que seja extremamente difícil servir refeições de sardinhas assadas e pão e vinho a milhares de pessoas, de forma minimamente aceitável. Pessoalmente evito e dispenso as guerrilhas por uma sardinha enquanto outros participantes carregam geleiras de sardinhas para levar para casa.