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sábado, 9 de outubro de 2021

Preciso de escrever uma carta à Molly , Seis meses sem ti meu amor

 "Preciso de escrever uma carta à Molly". Levantou-se da mesa e dirigiu-se assim ao escritório, resoluta, como se escrever uma carta à Molly fosse uma natural e urgente necessidade, como quem vai ali à casa de banho, ou vai ali desligar o forno, acto que caso não fosse feito, algum resultado terrível e irrecuperável se manifestasse... Mas é assim que é sentido. E se assim é sentido, assim é vivido. De outra forma, a vida é uma farsa e isso não é para o nós.

Querida Molly

Não imaginas como a vida aqui sem ti continua. Sabes? Temos agora dois gatos! Dois seres maléficos e satânicos, como o são todos os gatos, que a menina fez o favor de trazer cá para casa...Ah, é verdade, ainda conheceste o Timmy Boy, esse anjo revelado mais tarde, um amor de gato, que chegou escanzelado e tímido, de olhos verdes e grandes, a preencher-lhe grande parte do focinho, como lanternas acesas, que assistiu a tudo. À nossa luta, às forças resgatadas de lugares desconhecidos até ali, à esperança desgastada, à tua partida, à morte, à tristeza disfarçada de aceitação, à dor fingida de resignação. Revelou-se um anjo, o meu Timmy, um verdadeiro anjo, que tem uma compreensão muito para além do compreensível. Olha-me e ele sabe e eu sei. Não precisamos falar. Ele ensinou-me a gostar de gatos, imaginas isso Molita? Eu?! Gostar de gatos?! Pois o Timão conquistou-me... Mas para além deste bicho, a menina trouxe também, passado pouco tempo de tu partires, a Olívia, uma desmiolada, uma destravada, uma gata sem juízo nenhum, uma filha rebelde, com tudo o que sempre me fez detestar gatos. E no fundo ainda detesto, sabes? Mas a Olívia, para além desse diabrete à solta pela casa, tem também uma faceta singular. Muito singular. Fala comigo! Fala! Juro que fala! E depois, claro...conquistou-me também. Talvez eu tenha um coração de manteiga. (não tenho!!!), mas esta miúda, completamente destravada, é como uma filha rebelde. Desafiadora, sempre a testar-nos e a medir forças. Teimosa, difícil, que dá luta e nos obriga a nunca baixar os braços, se a quisermos educar. E nós queremos e jamais desistiremos, por muito trabalho que dê! Como um filho! Mas depois...depois, quando ela fala comigo, eu derroto-me completamente. A sério Molly, nunca pensei que um estúpido gato pudesse fazer-me sentir assim, sentir isto. Amor.

É...por aqui muita coisa mudou com a tua partida e uma delas foi a invasão da casa por estes dois felinos. Ocuparam. O espaço, o tempo, os pensamentos. As mãos em tarefas e afagos. Ajudaram-me. A estar ocupada. Claro que não têm nada a ver contigo! Nada! E nunca jamais te "substituirão". Um Cão é sempre um Cão e eles são só dois gatos. Mas esta ocupação, confesso e admito, tem-me ajudado a continuar a viver sem ti, admito perfeitamente. Mas tu meu amor, tu estás cá sempre e para sempre. Sabes? Eles por vezes vão-se deitar nos teus lugares preferidos da casa, e sabes, por vezes até adoptam as tuas posições, o que não me parece nada normal num gato, mas juro que até se parecem contigo. Claro que os lembro sempre num tom fingido de repreensão "esse lugar é da Molly!" O teu "lugar" jamais será ocupado! Porque tu, meu amor, és inesquecível, única, eterna dentro de mim, e de mim para fora, nunca te esquecerei e estás "cá" sempre e para sempre! Nem sei mesmo se algum dia conseguirei ter outro cão...as comparações serão inevitáveis e talvez inaceitáveis e insuportáveis...E o "pobre novo cão" não terá culpa nenhuma...Agora gatos...perfeitamente! São "só" gatos, afinal de contas.

Olho para o calendário: 9 de Outubro de 2021. Faz exactamente 6 meses que partiste para parte incerta. Já não te procuro pelos montes e vales que palmilho afincadamente, ora a sorrir ora a conter lágrimas. Encontro-te segura, serena e feliz, onde sempre estiveste e sempre estarás: no meu coração.

Até já Molito!