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sábado, 4 de abril de 2009

O Convento de Mafra e a 27ª Corrida dos Sinos

“D.João, quinto do nome na tabela real, irá esta noite ao quarto de sua mulher, D.Maria Ana Josefa, que chegou há mais de dois anos da Áustria para dar infantes à coroa portuguesa e até hoje ainda não emprenhou. Já se murmura na corte, dentro e fora do palácio, que a rainha, provavelmente, tem a madre seca, insinuação muito resguardada de orelhas e bocas delatoras e que só entre íntimos se confia. Que caiba a culpa ao rei, nem pensar, primeiro porque a esterilidade não é mal dos homens, das mulheres sim, por isso são repudiadas tantas vezes…/…

…/… Vestem a rainha e o rei camisas compridas, que pelo chão arrastam, a do rei somente a fímbria bordada, a da rainha bom meio palmo mais, para que nem a ponta dos pés se veja, o dedo grande ou os outros, das impudicícias conhecidas talvez seja esta a mais ousada. D.João V conduz D. Maria Ana ao leito, leva-a pela mão como no baile o cavaleiro à dama, e antes de subirem os degrauzinhos, cada um de seu lado, ajoelham-se e dizem as orações acautelantes necessárias, para que não morram no momento do acto carnal, sem confissão, para que desta nova tentativa venha a resultar fruto, …/…

…/… D.João V sonhará esta noite. Verá erguer-se do seu sexo uma árvore de Jessé, frondosa e toda povoada dos ascendentes de Cristo, até ao mesmo Cristo, herdeiro de todas as coroas, e depois dissipar-se a árvore e em seu lugar levantar-se, poderosamente, com altas colunas, torres sineiras, cúpulas e torreões, um convento de franciscanos, como se pode reconhecer pelo hábito de Frei António de S.José, que está abrindo, de par em par, as portas da igreja. Não é vulgar em reis um temperamento assim, mas Portugal sempre foi bem servido deles.”

In “Memorial do Convento", José Saramago


E eu...de regresso de férias hoje, e amanhã dia 5 de Abril do ano de 2009, em Mafra, na:

27ª Corrida dos Sinos, onde gostaria de ouvir o carrilhão do Convento a tocar, como aconteceu nalgumas edições passadas, mesmo chorando eu e rindo os sinos... mas mesmo que passemos em silêncio, minúsculos e insignificantes ao lado do imponente Convento, eu sei que irão repicar os sinos... basta querer... e eu quero!

Até amanhã

3 comentários:

Fernando Andrade. disse...

Olá, Ana
Essas férias foram de fazer "inveja", hein!???
Gostei da invocação do Memorial do Convento, por onde amanhã passaremos a correr, sem o repicar dos carrilhões.
Estou a pensar cá com os meus botões :-será que os sinos não se ouvem porque alguém, para irritar Bento XVI, colocou perservativos nos badalos,eheheh!
Ai as blasfémias!!!:...

Cláudio disse...

Não fosse o "Ano da Morte de Ricardo Reis", e essa seria a melhor obra de literatura do nosso século XX. Mas é, sem dúvida, a mais bela história de amor. Melhor que a dos fidalgotes de Viseu do Amor de Perdição... Baltazar que é Sol e Blimunda que é Lua... Do outro mundo! Boa corrida dos sinos!

Anónimo disse...

E porque haverias tu de chorar, Ana?

Há dois anos corri. Esperei os carrilhões saudarem-me, mas estiveram mudos, porém, a melhor "sinfonia" que podia ter ouvido foram umas breves palavras, que jamais voltarei a ouvir.

Chorar porquê, Ana?
Sorrir, sorrir sim. E com sorrisos brindar a vida e à vida. Ainda que os carrilhões estejam quietos.

Beijinhos