Há um livro para escrever. Inacabado. E para pintar também. Personagens brancas delineadas com um traço grosso a preto, esperam cor.As palavras são escritas e apagadas consecutivamente. Escrevo de novo sobre o que escrevi, apago, volto a escrever, borro a tinta sobre elas e quase rasgo o papel ao tentar apagar.
Difícil este capítulo. Longo, já sem interesse e difícil da página virar. Escrevo. Insisto e não desisto, apesar dos retrocessos, do apagar com raiva até quase rasgar o papel para depois afinal escrever as mesmas frases, as mesmas lamúrias e ainda os mesmos sonhos.
Para as figuras faltam-me os lápis de cor. Tenho de pedir à minha filha. Na sua imensa mochila da escola, a avaliar pelo peso, de certeza que traz até o arco-íris inteiro e o céu atrás!
De tanto borrão neste papel amarelo, já muito poucos conseguem ler o que lá está escrito e descrito, tantas vezes a história alterou, avançou e recuou. Hoje, muito poucos me ouvem e são ainda menos os que me vêm quando me olham. A paciência esgota-se, e até eu estou farta de mim. Compreendo todos. Os que deixaram de me ouvir e de me ver ao olharem-me. Como os compreendo…
Mas sabe bem saber que ainda sobra alguém, que simplesmente… me vê, quando me olha.
Correr? Já nem sei o que isso é. Tenho as vias respiratórias em chagas, o corpo debilitado e a cabeça pesa-me uma tonelada, o que me parecem razões mais que suficientes para não treinar sem ter quaisquer problemas de consciência pesada. O pior vai ser quando melhorar...


Mas para além do resto, tenho andado com o aparelho respiratório afectado, pelo que me sinto incapaz de correr, mesmo quando posso, o que neste momento me serve perfeitamente de desculpa.

Hoje já não me deixo enganar (pelo menos com a mesma facilidade de há uns anos atrás) e as palavras e os homens são analisados num autêntico laboratório improvisado para o propósito, antes de assimilados e dados como factos efectivos e reais. O que também me faz correr o risco de não acreditar em nada e em ninguém e estar condenada para sempre à solidão, mas dá-me também a segurança e a garantia de não ser atraiçoada e enganada.









